quinta-feira, 29 de setembro de 2011
FALA DA MULHER SÓZINHA de Eduardo Olímpio
acompanhada de nada
Já estou cheia de ser rua
tão corrida e tão pisada
Já estou prenha de amizades
Tão barriga de saudades
Ai eu ainda um dia irei rasgar a solidão
E nela entrelaçar o olhar duma canção
Chegar ao cume, ao cimo, ao alto
Mais longe mais além
Mas a saber que sou mulher
Na cidade sou loucura
sou begónia, sou ciúme
Eu que sonhava ser lume
caminho atrás da lonjura
Não faço parte da festa
Sou a migalha que resta
http://youtu.be/4s6Y7zkRpJI
quarta-feira, 28 de setembro de 2011
LÁGRIMA de Amália Rodrigues
Cheia de penas me deito
E com mais penas
Com mais penas me levanto
No meu peito
Já me ficou no meu peito
Este jeito
O jeito de te querer tanto
Desespero
Tenho por meu desespero
Dentro de mim
Dentro de mim o castigo
Não te quero
Eu digo que não te quero
E de noite
De noite sonho contigo
Se considero
Que um dia hei-de morrer
No desespero
Que tenho de te não ver
Estendo o meu xaile
Estendo o meu xaile no chão
Estendo o meu xaile
E deixo-me adormecer
Se eu soubesse
Se eu soubesse que morrendo
Tu me havias
Tu me havias de chorar
Uma lágrima
Por uma lágrima tua
Que alegria
Me deixaria matar
http://youtu.be/8EGRZDuVLBY
segunda-feira, 26 de setembro de 2011
CANSAÇO de Luís de Macedo
De olhos fixados nos meus
Alguém que passou por cá
E seguiu ao Deus dará
Deixando os olhos nos meus
Quem dorme na minha cama
E tenta sonhar meus sonhos
Alguém morreu nesta cama
E lá de longe me chama
Misturada nos meus sonhos
Tudo o que faço ou não faço
Outros fizeram assim
Daí este meu cansaço
De sentir que quanto faço
Não é feito só por mim
http://youtu.be/IcxJ4MYL0_0
sábado, 24 de setembro de 2011
FOI NA TRAVESSA DA PALHA de Joaquim Frederico de Brito
Que o meu amante, um canalha
Fez sangrar meu coração
Trazendo ao lado outra amante
Vinha a gingar, petulante
Em ar de provocação
Na Taberna do Friagem
Entre muita fadistagem
Enfrentei-os sem rancor
Porque a mulher que trazia
Com certeza não valia
Nem sombras do meu amor
P'ra ver quem tinha mais brio
Cantamos ao desafio
Eu e essa "outra" qualquer
Deixei-a a perder de vista
Mostrando ser mais fadista
Provando ser mais mulher
Foi uma cena vivida
De muitas da minha vida
Que não se esquecem depois
Só sei que de madrugada
Após a cena acabada
Voltamos p'ra casa os dois !
http://youtu.be/1Olz3fShSUw
quinta-feira, 22 de setembro de 2011
"GRITO" de Amália Rodrigues
Silêncio
Do silêncio faço um grito
E o corpo todo me dói
Deixai-me chorar um pouco
De sombra a sombra
Há um céu tão recolhido
De sombra a sombra
Já lhe perdi o sentido
Ao céu
Aqui me falta a luz
Aqui me falta uma estrela
Chora-se mais
Quando se vive atrás d'ela
E eu
A quem o céu esqueceu
Sou a que o mundo perdeu
Só choro agora
Que quem morre já não chora
Solidão
Que nem mesmo essa é inteira
Há sempre uma companheira
Uma profunda amargura
Ai solidão
Quem fora escorpião
Ai solidão
E se mordera a cabeça
Adeus
Já fui p'r'além da vida
Do que já fui tenho sede
Sou sombra triste
Encostada a uma parede
Adeus
Vida que tanto duras
Vem morte que tanto tardas
Ai como dói
A solidão quase loucura
quarta-feira, 21 de setembro de 2011
"HERANÇAS" de Susana Metello Lopes
Este soluço magoado
Pôs-me na garganta a noz
Dolente e bela do Fado
Meu pai deu-me a poesia
E este gosto de escutar
A doce melancolia
Duma guitarra a trinar
Também herdei a magia
De ter nascido em Lisboa
No meu peito há Mouraria
Nos meus olhos Madragoa
Trago Fado nos sentidos
Que linda Herança a minha
Que os meus dois amores queridos
Deram à sua alfacinha
Minha Herança é a mais bela
Que alguém jamais recebeu
Azul e rosa aguarela
O Fado, a Guitarra e eu !
http://youtu.be/d5Whx7z-rk0
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
"MARIA LISBOA" de David Mourão Ferreira
Tem movimentos de gata
Na canastra a caravela
No coração a fragata
Em vez de corvos, no xaile
Gaivotas vêm poisar
Quando o vento a leva ao baile
Baila no baile com o mar
É de conchas o vestido
Tem algas na cabeleira
E nas veias o latido
Do motor d'uma traineira
Vende sonho e maresia
Tempestades apregoa
Seu nome próprio : Maria
Seu apelido : Lisboa
http://youtu.be/_Tqz-GWIY1k
"Marcha de Campolide" de António José
Anda ver meu bairro a Campolide
Queria lá morar a vida inteira
Tem o bairro ruas, não sei quantas
A Rua Conde das Antas
Mais a Marquês de Fronteira
Sobe essa Calçada que é vizinha
Porque depois da Quintinha
Vais parar às Amoreiras
Cá vai a marcha de Campolide
Canta com alma e coração
Desce a Calçada que é dos Mestres
e por sinal
Com muito jeito vais direito
ao Olival
Cá vai a marcha de Campolide
Leva um convite cada balão
A marcha é minha
A marcha é tua, vejam bem
E quem quiser cantar venha também
Ora vamos lá, vamos lá bailar
Quem é que não vem ?
Ora vamos lá, que já tem um par
Que dança também
Meu coração parece um balão
que arde a noite inteira
E tu tens fama de ser a chama
dessa fogueira
Anda ver, que vês em Campolide
Seus arcos gigantes, pois então !
Verás que do meu bairro não desdenhas
D. Carlos de Mascarenhas
quer manter a tradição
Anda, vem cá ver, dá mais um salto
Sobe agora ali mais alto
Ao Alto do Carvalhão
sábado, 17 de setembro de 2011
"MEU PORTUGAL MEU AMOR" de José Luís Gordo
Donde vens, p'ra onde vais
Com tanta gente a fazer
Dos teus dias os meus ais
Ai meu país
Minha terra portuguesa
De Camões que tu tiveste
Pelo ventre da tristeza
Todos os dias te canto
A condição de ser tua
Neste fado neste pranto
Eu por ti ainda canto
Descalça por qualquer rua
Não sei se te cante ou chore
Não sei se te grite um dia
Que na força deste canto
Rasgo a alma e digo em pranto
Que eu por ti ainda morria
Ai meu país
Que trazes nos olhos fado
Desse rei que não voltou
Ao seu povo desejado
Na minha boca
Trago sempre o teu sabor
Por isso te canto e digo
Meu Portugal, meu amor
http://youtu.be/yhvk-KWI3co
"MOURARIA DO PASSADO" de Gabriel de Oliveira e Francisco Pinto
Há festa na Mouraria
É dia da procissão
Da Senhora da Saúde
Até a Rosa Maria
Da Rua do Capelão
Parece que tem virtude
Desde manhã bem cedinho
Todo o bairro vai rezar
Há fé, amor e alegria
Tudo cheira a rosmaninho
Estalam foguetes no ar
Há festa na Mouraria
Do passado ainda resta
Ver o povo em comunhão
Numa fé que não ilude
Está a Mouraria em festa
É dia da procissão
Da Senhora da Saúde
É famosa a tradição
Que venera a linda santa
Desde o Benformoso à Guia
E depois da procissão
Tudo bebe, tudo canta
Até a Rosa Maria
Ouve-se um fado qualquer
Cantado com devoção
Numa voz sentida e rude
E a mais descrente mulher
Da Rua do Capelão
Parece que tem virtude
sexta-feira, 16 de setembro de 2011
"O MEU PRIMEIRO AMOR" de Nelson de Barros
Ai como eu era, como te amei, Santo Deus
Meus olhos pareciam dois franciscanos
À espera do céu que vinha dos teus
Beijos que eu dava
Ai como quem morde rosas
Como te esperava na vida que então vivi
Podiam acabar os horizontes
Podiam secar as fontes, mas não viva sem ti
Ai como é triste, de o dizer não me envergonho
Saber que existe um ser tão meu, tão ruím
Tu que eras o ombro para o meu sonho
Traíste o melhor que havia em mim
Ai como o tempo pôs neve nos teus cabelos
Ai como o tempo as nossas vidas desfez
Quem dera ter outra vez desenganos
Ter outra vez vinte anos
Para te amar outra vez

quinta-feira, 15 de setembro de 2011
"PRECISO DE ESPAÇO" de Vasco de Lima Couto
Para ser feliz
Preciso de espaço
Para ser raíz
Ter a rede pronta
Para o mar de sempre
Ter aves e sonho
Quando a terra escuta
E falar de amor
Aos tambores da luta
Ter palavras certas no sol o caminho
E beber a rir o doirado vinho
Misturar a vida, misturar o vento
E nas madrugadas
Quando o povo abraço
Para estar contigo preciso de espaço
Preciso de espaço
Para ser feliz
Preciso de espaço
Para ser raíz
Caminhar sem ódio
Falar sem mentira
Ter meus olhos longe
Da luz duma estrela
E ser como um rio
Que se agita ao vê-la
http://youtu.be/Rq8UH0FDuxE

"SER FADISTA"
Não sei que vida é a tua
que andas armado em senhor
Fado tu gostas é de algazarra
Dum xaile, d'uma guitarra
das patuscadas do amor
Ser fadista
ser um fadista de raça
É enfrentar a ameaça
é uma graça que Deus nos deu
Ser fadista é o destino que chora
Nascido na mesma hora
em que o fadista nasceu
Ser fadista é dar a mão á saudade
Que anda a chorar p'la cidade
é ser pobre com altivez
Ser fadista é destino que se perdoa
Oração à fé de Lisboa
ser fadista é ser português
Fado há uma voz que te chama
P'rás vielas de má fama
onde o sol nunca entrou
Fado bateste à porta da vida
Onde uma mulher perdida
p'ra não chorar te cantou
http://youtu.be/nbP_ZpqRzcg

domingo, 11 de setembro de 2011
"TUDO ISTO É FADO" de Aníbal Nazaré
Se eu sabia o que era o Fado
Eu disse que não sabia
Tu ficaste admirado
Sem saber o que dizia
Eu menti naquela hora
E disse que não sabia
Mas vou-te dizer agora
Almas vencidas, noites perdidas, sombras bizarras
Na Mouraria canta um rufia, choram guitarras
Amor ciúme, cinzas e lume, dor e pecado
Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado
Se queres ser o meu senhor
E teres-me sempre a teu lado
Não me fales só de amor
Fala-me também de Fado
A canção que é meu castigo
Só nasceu p'ra me perder
O Fado é tudo o que eu digo
Mais o que eu não sei dizer

sábado, 10 de setembro de 2011
Duas Glórias de João da Mata
Ambas de iguais sentimentos
Duas mulheres, duas glórias
Dois nomes, dois sofrimentos
Uma andou p'la Mouraria
E p'lo Campo de Santana
Conduzindo a nostalgia
Nos seus olhos de cigana
A outra em salões doirados
Da triste sorte irmã gémea
Trazia os dias contados
Nos seus olhos de boémia
Ambas souberam cantar
O fado que as embalava
Se uma chorava a cantar
A outra a chorar cantava
Cada qual em sua era
Dois nomes cheios de glória
Um a Maria Severa
Outro a Maria Vitória
